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Foto do escritorPriscilla Colares

Um papo com o papa Papazian


Charlie Papazian é um ícone. É o cervejeiro caseiro mais famoso do mundo. Fundou o Great American Beer Fest, um dos principais festivais de cerveja do mundo, que acontece anualmente nos EUA há 32 anos; fundou a Associação Americana de Cervejeiros Caseiros e, depois, a Associação de Cervejeiros, que, em 2005, se fundiu com a Brewers Association (BA), da qual ele é presidente e reúne mais de 50 mil membros (entre caseiros e artesanais). E é autor da bíblia The Complete Joy of Home Brewing (algo como “a incrível alegria de fazer cerveja em casa”, ainda sem edição em português). Casado com uma brasileira, ele estava no Brasil em férias na semana passada e, a convite da Associação Brasileira de Cerveja Artesanal (Abracerva), encontrou-se com 40 cervejeiros e donos de bares brasileiros para um bate-papo. No encontro estava Priscilla Collares. Mineira, gente boa e bebedora de cerveja, Priscilla é voluntária da Abracerva e sommelière. Ela entrevistou Papazian para o Paladar.


No Rio. Ícone cervejeiro, Papazian esteve no Brasil e gostou do que bebeu. FOTO: Divulgação

Esse calorão do Rio inspirou você a tomar cervejas locais? Eu estava à procura delas e fiquei surpreso e feliz com o que encontrei aqui.

Não é sua primeira vez no Brasil; o que mudou na cena cervejeira desde sua última visita? Parece que saiu do zero para o que é agora. Há oito anos, última vez que vim, só encontrava Brahma, Skol, Kaiser e Heineken, não tinha mais nada. Quer dizer, tinha, mas eu não conseguia achá-las sozinho.

Qual a cerveja mais diferente que você já provou? Foi no Zimbábue. Eu fui num biergarten lá e a cerveja era feita de sorgo e outros grãos e fermentada com bactéria láctica para ficar azeda. Ela é bebida enquanto ainda está fermentando. Além de ter um gosto atípico, foi servida em baldes de plástico. Você pega os baldes e compartilha com todas as outras pessoas.

Tem algum estilo de cerveja de que goste mais? Não, não tenho. As cervejas que bebo são as que faço. Tenho em casa pale ales, uma helles, IPA, uma lager escura, uma bock, uma bitter inglesa. Elas são geralmente com teor de álcool mais baixo, 5% ou 6%, assim posso beber mais.

Existe uma ‘escola americana’ de fazer cerveja? A abordagem americana é internacional. Há muito respeito pelos estilos tradicionais – alemães, ingleses, belgas e até indígenas. Mas, ao mesmo tempo, o jeito americano de fazer cerveja é aberto. E todos amam fazer experiências. Você pode ver isso no uso do lúpulo, nas experiências com envelhecimento em barris de madeira, gerando às vezes cervejas sours (ácidas), mas nem sempre. São barris de uísque, de todo tipo de madeira, para criar novos sabores.

No ano passado, quase 50 mil pessoas foram ao Great American Beer Fest. Por que tanto sucesso? O evento tem 32 anos. Para fazer um festival é preciso buscar o que as pessoas querem em ver e tentar criar experiências melhores todas as vezes. No sentido prático, a melhor maneira para desenvolver qualquer festival é permitir que as pessoas provem todos os tipos de cerveja. E fizemos o GABF desse jeito: cobramos uma entrada e damos um copo de degustação de 30 ml. Você pode provar a mesma cerveja várias vezes se quiser, mas encorajamos as pessoas a provarem estilos diferentes.

Você já foi chamado de pai dos cervejeiros caseiros. Como se sente quanto a tudo isso? É sobre o que cerveja artesanal é: identificar e aprender sobre valores, seja da cerveja ou das cervejarias, e tentar ver como isso tudo se aplica a seus próprios valores. Aprecio todo o agradecimento e reconhecimento pelos anos que tenho trabalhado com isso, mas me vejo mais como uma pessoa reservada. Gosto de andar de bicicleta e escalar, comer com a família e amigos, como todo mundo.

Você já deve ter recebido várias propostas para abrir uma cervejaria. Por que nunca quis? Muitos me perguntaram se eu já havia pensando em abrir a própria cervejaria. A resposta é sim, já pensei muito sobre isso. E é porque pensei muito que decidi não abrir (risos). Gosto da maneira como estou envolvido com a cerveja como cervejeiro caseiro, educador e parte de uma associação que aproxima as pessoas e as induz a aprender sobre o assunto. Acredito que poderia fazer e vender cerveja com sucesso, mas não é o tipo de trabalho que quero ter.

Qual a importância dos cervejeiros caseiros para o mercado de cervejas? Nos Estados Unidos isso é bem óbvio: a cena cervejeira é muito ativa por causa dos caseiros. Eles desenvolvem uma paixão e querem ensinar outras pessoas. Nos EUA são mais de 1,25 milhão de cervejeiros caseiros. É muita gente. Se 30 amigos provarem suas cervejas – e ouvirem como foram feitas e porque são assim –, serão 30 milhões introduzidos nesse universo.

A cena cervejeira no Brasil tem crescido muito, mas ainda é um mercado muito pequeno. Quais são os maiores desafios neste momento de crescimento? Continuar a educar as pessoas sobre o que é realmente especial na cerveja artesanal. Por que e como é diferente, além de maneiras de apreciar. Eu acho que a maioria das pessoas aqui no Brasil pensa em cerveja como algo refrescante, “água com gás”, algo para beber e se refrescar. Mas cerveja contribui para tantas outras coisas além de refrescar. Pode ser exatamente como o vinho, uma experiência excelente com o jantar ou tipos variados de comida de toda parte do mundo. Os desafios para que as cervejarias artesanais possam crescer estão na educação. Festivais, publicações e sites facilitam o aprendizado, mas sem dúvida mudanças de leis e taxação são necessárias. Onde as leis são muito restritas, ou se cobram muitos impostos, as cervejarias artesanais não têm tanto sucesso.

Lupuladas, envelhecidas, sours (azedas)…

Qual é a próxima moda americana? Acho que as cervejas session, interpretações de cervejas mais alcoólicas feitas com baixo teor alcoólico.

Você é cervejeiro caseiro desde muito tempo. Fundou e foi presidente da associação de cervejeiros caseiros dos EUA e continua como presidente da BA, é escritor e educador. Qual é seu próximo passo? Voltar para casa e tomar minha bock no dia do meu aniversário (Papazian completou 70 anos na sexta, 23). E acho que minha visita ao Brasil e ao Rio ilustra algumas das coisas que quero continuar a fazer: visitar países que estão começando suas aventuras nas cervejas artesanais.

>>Veja a íntegra da edição do Paladar de 29/1/2015

Publicado originamente no site do Paladar

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